Segundo o colunista da Folha, posse do deputado não pode ser qualificada como imoral, uma vez que a sua condenação não é incontroversa
José Genoino foi condenado a seis meses e 11 meses de
prisão porque, na condição de ex-presidente do PT, assinou um empréstimo
de R$ 3 milhões com um banco mineiro que, segundo a versão que vingou,
era fictício e teve o propósito de lesar os cofres públicos. Ocorre que
esse mesmo empréstimo foi validado pelo Banco Central e também quitado
pelo tomador – no caso o PT. Por isso mesmo, Genoino propaga sua
inocência. E o colunista Janio de Freitas, da Folha, argumenta que sua
posse não pode ser qualificada como imoral. Leia abaixo:
Moral ou imoral
Sentir a dignidade ultrajada por uma injustiça poderia justificar a decisão de Genoino de defendê-la com um ato político
Seja qual for a verdade a que José Genoino se refere, como razão da sua "consciência serena e tranquila" e a surgir "mais cedo ou mais tarde", sua decisão entre aceitar ou recusar a volta à Câmara é, a meu ver, de apreciação muito menos simples do que pareceu à maioria das opiniões divulgadas.
Pensei cá comigo, como faço nas dúvidas frequentes, em como agiria sob situação semelhante. Não achei resposta segura.
O motivo maior do impasse, entre vários, partiu da firmeza com que Genoino se afirma inocente, desde o início do escândalo. E cada vez com maior emoção.
Calma aí, não são todos os acusados que se dizem inocentes, não. Nem mesmo no caso desse denominado mensalão.
Marcos Valério e Delúbio Soares não o fizeram. Procuraram minimizar parte dos seus atos, justificar outros e negaram alguns, isso sim.
Silvio Pereira cedo preferiu a permuta de confissão por pena branda, a chamada delação premiada: um modo de negar a inocência.
"Legal, mas imoral!", disseram muitos sobre a decisão de Genoino por se empossar. Imoral, moral?
Pois me dei conta de que seria exatamente como defesa de minha moral, se a sentisse injustiçada, que a posse me atrairia.
Uma afirmação altiva do direito da inocência aos direitos a ela inerentes.
Também pensei em sentido oposto. Injustiças indignam e enjoam. Mandar tudo às favas, de um modo à altura da injustiça, também me pareceria possível.
Enfim, sentir a dignidade ultrajada por uma injustiça poderia justificar a decisão de José Genoino de defendê-la, com um ato político e institucional, e à sua convicção de inocência.
Não tenho como saber o que o moveu nem estou questionando a veracidade da inocência ou a culpa imputada. O assunto é outro.
E é o mesmo. A dimensão e o transcurso conturbado do julgamento no Supremo deixaram um ambiente tão excitado e desmedido que mesmo os não facciosos se confundem e incorrem em imprecisões injustas.
A respeito da posse, ouvi por exemplo pela CBN, na quinta-feira, respeitado professor de filosofia dizer que "ficou provado" que José Genoino "assinou um empréstimo com o propósito de lesar o erário público".
Tal propósito, fosse atribuído a Genoino ou ao empréstimo, não foi provado nem esteve sequer próximo disso. No valor de R$ 3 milhões, foi quitado pelo PT em parcelas depois do escândalo.
Genoino está condenado a 6 anos e 11 meses por corrupção passiva e por quadrilha, como presidente do partido em cujo interesse foram feitas as transações montadas por Marcos Valério, o PT e o Banco Rural.
Em alguma parte ou no todo dessa acusação supõe-se que esteja, com a consequente injustiça, a burla da verdade a surgir "mais cedo ou mais tarde".
Se e quando surja, estará dizendo se a posse de José Genoino foi "legal, mas imoral!" ou legal e moral.
Janio de Freitas, colunista e membro do Conselho Editorial da Folha, é um dos mais importantes jornalistas brasileiros. Analisa com perspicácia e ousadia as questões políticas e econômicas. Escreve na versão impressa do caderno "Poder" aos domingos, terças e quintas-feiras.
Nenhum comentário:
Postar um comentário