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Julgamento do "mensalão"
A Câmara desafia o Supremo, que desafia a Constituição
Gabriel Bonis
*Matéria atualizada às 12h30 de 13 de dezembro
A possível decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de cassar o
mandato dos deputados condenados no julgamento do “mensalão”, que pode
acontecer nesta semana, tem o potencial de criar uma crise de proporções
imprevisíveis entre o Judiciário e o Legislativo brasileiro.
Os contornos deste cenário serão desenhados de acordo com o voto do
ministro decano Celso de Mello, responsável por desempatar as discussões
sobre a competência da Câmara dos Deputados ou do STF de cassar os
mandatos dos parlamentares João Paulo Cunha (PT-SP), Valdemar Costa Neto
(PR-SP) e Pedro Henry (PP), condenados no julgamento do “mensalão”.
A tendência adiantada por Celso de Mello na segunda-feira 10 é a de
conceder à Suprema Corte a cassação imediata dos mandatos, enviando à
Câmara apenas uma notificação. Uma gripe o impediu de proferir o voto na
quarta-feira 12, o que adiou a decisão. Na quinta-feira 13, o ministro foi internado com suspeita de pneumonia. Assim, a decisão ficou para a semana que vem.
De toda forma, caso seja confirmada a tendência e ele vote pela perda
de mandatos, a decisão provoca polêmica. Isso porque seria uma medida
inconstitucional, segundo analistas ouvidos por CartaCapital.
Para eles, a palavra final sobre a perda dos mandatos é da Câmara, que
deverá, caso provocada por algum partido, realizar um processo
específico com esta finalidade.
Ao decidir pelo contrário, o STF poderia instigar uma crise de
competências, uma vez que o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS),
adiantou que não cumprirá a decisão por considera-la inconstitucional.
“Espero que o Supremo tome uma posição equilibrada, olhando para a
Constituição e para a necessidade de não se estabelecer uma crise
institucional. Não há motivo para avançar sobre a prerrogativa da Câmara
ou de medida que cause uma disputa”, disse ao portal IG. “A
cassação seria um ataque frontal a Constituição, à autonomia do
Legislativo e ao equilíbrio dos poderes. A lei é clara: cassação de
mandados de parlamentar só pelo Congresso Nacional. A Câmara não vai
cumprir e recorrerá ao próprio STF.”
A postura do STF, defende Claudio José Langroiva Pereira,
professor-doutor em Direito Processual da PUC-SP, representa um “risco
de ingerência nos limites de competência de um poder sobre o outro”.
“Isso pode gerar uma crise no Estado democrático de Direito, já que o
Legislativo vai se manifestar a respeito. É um risco desnecessário e que
vai levar a consequências imprevisíveis”, vaticina. “É uma
interferência do STF na competência da Câmara, uma invasão”, completa
Pedro Serrano, colunista de CartaCapital e professor de Direito Constitucional da PUC-SP.
O presidente do STF e relator do caso, Joaquim Barbosa, tem sido o
orador mais enfático pela perda imediata dos mandatos. Segundo o
ministro, a Constituição concede ao Supremo o poder de suspender os
direitos políticos dos condenados pelo tempo da pena e, logo, estes
perderiam seus mandatos na Câmara. Já para o revisor do caso, Ricardo
Lewandowski, os direitos políticos devem ser suspensos para impedir a
participação em novas eleições pela duração da condenação. Mas, em
relação ao mandato atual, caberia à Câmara analisar a cassação. No caso
de José Borba, prefeito de Jandaia do Sul (PR), a maioria dos ministros
concordou com a perda do mandato após a sentença da corte.
O embate entre Barbosa e Maia, e as instituições a que presidem, pode
estar próximo. O relator enfatizou que caberia ao STF emitir o
comunicado à Câmara, que poderia ou não cumprir a decisão. “Caso não
cumpram, que arquem com as responsabildiades”, disse.
Mas quais seriam as consequências de uma resposta negativa de uma das
Casas do Congresso? O assunto é controverso, pois não há precedentes
semelhantes. “Em tese, o Supremo pode alegar que houve descumprimento de
ordem judicial, que é um crime. Entretanto, o presidente da Câmara
estaria agindo dentro de suas funções parlamentares e com imunidade por
isto”, explica Pereira.
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