Julgamento do mensalão já começa a ser julgado
portal brasil247.com
Que papel a
história reserva para os ministros do Supremo Tribunal Federal que
conduziram o espetáculo? Como eles serão lembrados no futuro? Aos
poucos, os ministros descobrem que a vida não se encerra no Jornal
Nacional, que reservou alguns segundos de fama para os juízes num
especial de 18 minutos sobre o tema
247 - Criminalista de renome, o advogado Antonio
Claudio Mariz de Oliveira cunhou uma frase lapidar num artigo que
escreveu sobre o julgamento da Ação Penal 470 (leia aqui).
"Não pode passar sem registro um outro aspecto extraído ou confirmado
pelo julgamento do mensalão: o poder da mídia para capturar a vaidade
humana e torná-la sua refém", disse ele.
Transmitido ao vivo, o julgamento deu ao povo brasileiro a
oportunidade rara de conhecer a personalidade de cada um dos ministros,
ao mesmo tempo em que ofereceu aos juízes uma janela para que
construíssem frases de efeito para as câmeras e para os telejornais –
especialmente para o Jornal Nacional, da Globo, que dedicou 18 minutos
ao tema, às vésperas do segundo turno.
Aos poucos, no entanto, o próprio julgamento começa a ser
julgado por pessoas de carne e osso e não pelos supostos intérpretes da
"opinião pública". E como já não há mais uma eleição na próxima esquina,
o interesse dos meios de comunicação em relação ao julgamento não é o
mesmo de antes. Outro especial de 18 minutos no JN não haverá. Os 15
segundos de fama já passaram.
Diante disso, o que resta para os juízes que conduziram o
espetáculo? Como eles serão lembrados no futuro, agora que estão
descobrindo que a história não se encerra no Jornal Nacional?
Ayres Britto se aposenta no dia 18. Sai frustrado. Não com
uma "pontinha de tristeza", mas com um iceberg de melancolia (leia mais
aqui)
por não ter conseguido proclamar a sentença e mandar seus antigos
companheiros de partido – sim, Ayres Britto já foi o "Carlim do PT" –
para a cadeia. Será lembrado, no máximo, pela sua poesia de qualidade
duvidosa.
Celso de Mello, o próximo a se aposentar, aproveitou os 15
segundos no Jornal Nacional para comparar o PT a duas organizações
criminosas: o PCC e o Comando Vermelho. Mas teve o dissabor de ver
lembrada a passagem do livro de Saulo Ramos, responsável por sua
indicação ao STF, sobre um voto que deu por pressão da Folha de S. Paulo
(leia mais aqui). Como consolo, ganhou de presente o movimento "Fica, Celso", para que não se aposente, lançado pelo insuspeito Augusto Nunes.
Marco Aurélio Mello também aproveitou seus 15 segundos no
Jornal Nacional para cunhar uma frase sob medida: a do "sintomático 13",
que indicaria o número de integrantes da quadrilha que era julgada pelo
STF. Mas demonstra um mal-estar crescente com o tribunal que emerge
deste julgamento.
Gilmar Mendes, que cultivava a imagem de um juiz
destemido, sem jamais se curvar à chamada opinião pública, terá o
dissabor de ver um novo STF se consolidar, não à sua imagem, mas à de
Joaquim Barbosa, que representa justamente a corrente do "direito achado
na rua" – votando em função daquilo "que a sociedade espera de nós".
Joaquim Barbosa, por sua vez, já vê seus dias de glória
ficarem para trás. Seu estilo irascível – e o estilo é o homem (leia
mais aqui)
– só é aceito pela elite brasileira quando atinge seus adversários
ideológicos. Jamais seria aceito, por exemplo, no julgamento do mensalão
mineiro ou de casos que envolvam representantes da aristocracia
brasileira.
Já o carioca Luiz Fux será lembrado como representante
máximo das soluções de improviso – Fux era aquele que em meio a um
conflito qualquer na dosimetria sugeria que se fizesse uma média entre
as penas. E jamais será esquecida, em Brasília, uma história que corre à
boca pequena. "Mensalão? Ah, isso eu mato no peito", teria dito um
ministro durante o processo seletivo.
Dias Toffoli foi aquele que inocentou José Dirceu, mas condenou José Genoino.
Rosa Weber e Carmen Lúcia souberam, ao menos, ser discretas.
E Ricardo Lewandowski teve a coragem de ser juiz. Foi o
único que alertou para o equívoco que vinha sendo cometido em relação à
doutrina do "domínio do fato". Em importante entrevista publicada neste
domingo, o autor da teoria, Claus Roxin, afirma que essa doutrina não
elimina a necessidade de provas e que julgamentos não devem ser
conduzidos pelos meios de comunicação, como verdadeiros espetáculos.
Pois o show está chegando ao fim, as cortinas estão se
fechando e, agora, cada ministro terá que lidar com sua própria
consciência.
Para quem assistiu de fora, fica a questão: ainda há juízes em Brasília?
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