CPI da Petrobras? Uuuuuuuhhh!
Por Osvaldo Bertolino, no site da Fundação Maurício Grabois:
A tentativa da direita de instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito
(CPI) para investigar a Petrobras é uma jogada que revela muito mais do
que a politicagem que lhe é peculiar. Revela também os limites do nosso
sistema eleitoral, que permite enviar para Brasília, por meio das urnas
dominadas pelo poder econômico, traficantes de drogas, estelionatários,
mandantes de assassinatos, lavadores de dinheiro e mais uma gama de
contraventores e foras-da-lei.
Verdadeiros Manchas Negras e Irmãos Metralha - e alguns Superpatetas -
posam de vestais nas CPIs, protagonizando situações tragicômicas, de
desesperador ridículo. Gente habituada ao tráfico de influência e à
falta de transparência dos acordos fechados entre quatro paredes, que
fala de “ética” como valor inegociável com um cinismo invulgar.
Poucos meses após a posse de Luiz Inácio Lula da Silva na Presidência da
República, em 2003, o escritor Luiz Fernando Veríssimo disse que o seu
governo era decepcionante. Decepcionou os que imaginavam que ele mudaria
tudo da noite para o dia e os que imaginavam que ele não mudaria nada.
Ou seja: Lula nem estava salvando, nem afundando o Brasil. Aquela quebra
de expectativas que Lula causou, tanto entre seus seguidores mais
entusiasmados quanto entre seus detratores mais empedernidos, acarretou,
por si só, um avanço inédito no amadurecimento do embate político no
Brasil. Ou seja: se de nada valesse a eleição de Lula, só o fato de ela
ter sido simbólica foi uma grande ruptura com a nossa história e
tradição política.
De um lado, perdeu a razão de ser o discurso salvacionista do PT - hoje
bandeira segurada por inexpressivos grupos "esquerdistas" que não se
cansam de fazer o papel de quinta-coluna - e, de outro, talvez na mesma
proporção, a propaganda irracional da direita contra as esquerdas, que
permeia historicamente largas fatias da sociedade brasileira, foi posta à
prova. Com a desconstrução das quimeras "esquerdistas" e das ficções
conservadoras, a própria dicotomia entre esquerda e direita vai ganhando
espaço no centro da discussão política como pano de fundo dos reais
problemas do país - que tendem cada vez mais a ser vistos na sua
essência, e não na sua superfície.
Esse é um debate presente dentro do próprio governo. Em nome da boa
administração macroeconômica, por exemplo, a direita diz que não se pode
agir com mais vigor na área social. Mas, se quisermos levar este debate
às raízes teóricas, devemos lembrar de conceitos políticos há muito
desvendados. O Estado é o governo de homens organizados em classes. E a
política é a arte de organizar os homens. A vida política, portanto, é o
afrontamento dos interesses sociais, de classe, pela direção do Estado.
Eis o que se aprende sobre política com o ABC do marxismo.
A realidade ingrata que devora sonhos
Evidentemente, a compreensão dessas categorias é difícil em um país de
oportunistas e de desmemoriados, de políticos invertebrados, de
caráteres melífluos, de posições dúbias, de meias palavras. Por isso,
talvez, em meio a esse fogaréu que começa a se instalar no país com a
aproximação das eleições presidenciais de 2014, recrudescem posturas que
sugerem descaso e indiferença do governo em relação à corrupção. São
discursos rasos, que estabelecem o emocionalismo se opondo ao indivíduo,
magoado em sua pureza ingênua como uma moçoila oitocentista, e a
realidade ingrata que devora sonhos.
Falo da ideia estapafúrdia de uma Comissão Parlamentar de Inquérito
(CPI) para "investigar a corrupção" na Petrobras. A última contribuição
da dupla mídia-PSDB e sua equipe de "patriotas" seria na verdade uma
grande confusão — caso instalada depois de todos os rodeios dos últimos
dias. É fácil imaginar o redemoinho em que podem se transformar as
notícias vazadas com segunda, terceira e quarta intenções no âmbito de
uma CPI como essa. Voluntária ou involuntariamente, o máximo que a
oposição tenta fazer é chantagem política diante do governo.
Ignorância trabalha contra a informação
É essa, unicamente, a leitura que se pode ter da proposta da CPI. O
objetivo é apenas fazer marola para atrapalhar o governo, negociar
alguma vantagem para a família e os amigos e nada mais. Não é, nem de
longe, estudar a fundo a questão, propor mudanças na legislação e criar
os meios para melhorar o combate à corrupção. É verdade que o governo
vinha entrando em atritos inúteis com o Congresso. Mas nada disso abona a
iniciativa de convocação de uma CPI. Ela serviria, no máximo, para
manipular os incautos com vistas a desgastar a imagem de adversários
políticos.
Não há, também, um comportamento suspeito do Executivo no episódio. A
mídia acaba agindo, em circunstâncias onde há grande disputa pela
atenção dos leitores, como amplificadora das turbulências e afinados
agentes ideológicos. A busca da informação de "maior impacto" costuma
afrouxar os controles sobre a qualidade e a veracidade da informação
divulgada. Há também os casos onde a ignorância trabalha contra a
informação. Seria muito melhor que o Congresso discutisse, a partir de
episódios como esse, a natureza da corrupção no Brasil.
CPI foi imaginada para chamuscar Lula
Seria útil também que, em vez de apostar em espertezas de resultados
políticos duvidosos, os deputados envolvidos nessa manobra se
empenhassem em dar agilidade aos trabalhos parlamentares. O governo,
portanto, não tem melhor alternativa do que obstruir a CPI por todos os
meios parlamentares conhecidos e toleráveis. O que está em jogo não é a
"moralidade pública", mas projetos políticos para o país.
Soprar fogo em uma CPI imaginada para chamuscar a presidenta Dilma,
portanto, não parece ser uma atitude coerente para parlamentares da base
aliada. Isso quer dizer que está tudo bem no campo governista? Não, não
quer. Mas também não quer dizer que tudo está mal. Seria muito bom,
claro, se o governo Dilma tivesse tratado a questão social do país com
uma dedicação maior do que a tratou. Porque é na dimensão micro de uma
sociedade que a vida das pessoas acontece. É lá que comemos,
trabalhamos, arrumamos emprego, reelegemos ou não. Poderia ter sido
melhor nesse quesito, não há dúvida.
Responsabilidade do governo Dilma
Como o governo agiu de forma relativamente eficiente na área social,
contudo, é possível que Dilma ganhe mais quatro anos dos brasileiros em
2014, já no primeiro turno, com uma vitória ainda mais contundente do
que a que realizou em 2010. Para isso, terá que resolver basicamente
duas questões. A primeira é o imobilismo em que se encontra. Será
preciso reorganizar-se internamente, articulando as forças que lhe dão
sustentação, e tomar outra vez a dianteira dos fatos, de modo a não ser
soterrado por eles. A segunda questão, muito mais complicada, será
coordenar esforços maiores na área social.
Ou seja: oferecer melhores serviços à sociedade, por meio de uma máquina
estatal mais eficiente e operando ao mesmo tempo cortes largos na
gastança com a especulação financeira. Essa tarefa, claro, está na
cartilha de qualquer governo progressista. Mesmo não sendo um privilégio
de Dilma, no entanto, o enfrentamento desse problema é responsabilidade
do seu governo no período que resta de seu mandato. Das soluções que
puder encontrar, não há dúvida, dependerá grandemente o futuro político
da frente de centro-esquerda que se formou em 2002, que passará por uma
prova de fogo em 2014.
Postado há 2 hours ago por Blog Justiceira de Esquerda
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